segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Vidros.
Muitos.
Não sei quem tem tanta coragem assim.
E se não era vidro era acrílico. 
Mas olhou e atrás de um tinha uma igreja.
Desceu, como era seu costume descer. Um, dois degraus, o terceiro chama-se chão.
Eram passos apressados, dança do receio. O zunido das homens era um aplauso. O sol cozinhava mendigos quase escalpelados, quase pelados, um de cada lado.
Eram os guardiões da igreja.
A porta é irracionalmente grande. Se a igreja tem tantos segredos, tantas riquezas, porque deixá-la tão vulnerável?
Bateu três, cinco vezes. Como ninguém atendesse, empurrou-a. A porta cedeu a um bem cru estímulo. A igreja não tem porteiro, o único que tinha foi crucificado há dois mil anos.
Mas aquela igreja estava fechada. Ela só abre na hora da missa, que é pra evitar gente dentro.
Deu passos desapressados, dança da insegurança. Não havia mais zunidos, só espadas de luz vindas das clarabóias. Não tinha barulho de correntes, nem de torneira pingando.
Um tanto de coragem, disse, mais ou menos baixo:
-Tem alguém aqui?
Nenhum retorno, mas quis a certeza. Dessa vez praticamente gritou.
-Tem alguém aqui, Cristo?
Mas a única coisa que ouviu foi os fantasmas de sua voz.
Então, assoviando o Hino Nacional, calmo como um psicopata que se prepara para dinamitar a Casa do Senhor, roubou o espaço que era das poeiras.
Escolheu um canto mais ou menos invicto, um atrás do órgão, que era pra não ser visto durante a operação. Mas tanto fazia. Em uma hora ninguém além dele quis rezar.
Pouco a pouco ia esvaziando a sua mochila, trocando peças, ligando coisas, conectando fios, tendo orgasmos só de pensar.
Tudo certo, mochilou-se e a passos tortos voltou ao zunido dos homens, àquele Sol que não tinha data.
Do lado de fora, escolheu um ônibus.
Acomodou-se como se acomodam os paulistanos.
Sentado, às vezes lembrava, às vezes pensava nos vidros, que eram caros, e muitos, ou pensava nos acrílicos.
Mas a noite ia ser boa.