segunda-feira, 27 de outubro de 2014

"De fato, há duas espécies de utopia: as utopias proletárias socialistas que têm a propriedade de nunca se realizarem, e as utopias capitalistas que têm a má tendência de se realizarem frequentemente"
Michel, 1973

Endireitar

O clamor popular nas ruas.
De vermelho o coreto se enfeita.
Eu, canhoto, destaco um pensejo:
Direita rubra ou direita azul,
Direita bugra ou a pau-no-cu*,
Qual direita eu almejo?
De direita em direita,
Pra esquerda um beijo.

A merda já feita,
Não tem nenhum jeito...
Nós
O povo
Tornamos a coisa direita!

*sem consentimento


A PONTA DO HUMANO, fisgada na carne que não sinto, o cheiro da meia que intumesce a rola, a impotência induzida que arremessa o desejo. como neblinar a cena cujas paredes tentaculares tentaculam - entram e saem de moi, levando os pedaços com dono e com sono e sem mim. paredão de nós, linhas aturdidas, seremos equiparados - aqui parados - equinos mesmos, cavalar calor, sós, sóis, sois nóis - negócios equinócios. a febre
aponta para o humano,
a ponta do que não sinto,
o pinto que há sob o pano.


passa
...........passo
......................posso
quantas histórias afogadas
terminam assim
.........................- de asco
lutando pra sair do poço
o carrasco de cada um
....................................de mim

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

...penso muito, penso e penso.
sinto ele longe, vejo ele perto:
beijo um espectro.
quero buscá-lo, por isso faço
:: pra tocar - como tocar o seu coração... -
sinto e ressinto dessa distância
(ânsia com razão),
sento e repenso - tenso o repente! -, 
tento e, num vinho tinto, tentação...


dois orientes no mundo: aqueles que me olham com olhar de admiração, estendem em dois metros a língua a força educada para acariciar mi'as bola; os outros, a cara da felicidade, transam repertório, voz grossa, liberam o brioco.

na linha que os divide, o afã da poesia, que, negligente consigo mesma, procura no horizonte, arco-íris, iludida, combustível.


......................o
.............prático pra mim
não o é pra
..................ti.
....................começo a prantear
......................,.meço.................,
.........................peço.................,
..................................e
......................................pronto!
...............a
............prática
...............a
.................ti
...................caminha, e
da...................minha
..............................cabeça,
.................................no entanto,
..........................fujo
................................dessa
...........................................tonto
.........................................................

domingo, 12 de outubro de 2014

infinitivo encerrado

que de tanto pensar em pensar
comecei a achar
que tudo o que eu deixei de fazer
ou deixei de falar
resultou por desleixo ocorrer
meu verbo atrofiar

ou

que de tanto pensar em pensar
comecei a achar que tudo o
.....que eu deixei de fazer ou dei-
...xei de falar resultou por deslei-
...xo ocorrer meu verbo atrofiar



a
....não haveria
.........................a
....não haveria
.........................l
..........................âmpada a nos
..............................................ex
..............................................terminar
...não haveria
............................................vez
...................................para desanimar
..................................de nos
.............................................examinar
caso você voltasse
.................................de costas
......sobre as coisas
......................................postas
.................neste
...........................fim
.................................de
............................................mês


temos uma terceira imagem no H.N.;
uma atualização daquela outra

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

r.: collage a posteriori - em português, penso em como concebo a porra toda, pra uma pessoa com quem gostaria de acordar às 5h pra assistir o nascer do sol tomando vinho na praia da ponta

em primeiro lugar, lhe disse, de acordo com a minha experiência com as pessoas, as coisas e os animais, enfim, [todas] as coisas acabam.
os processos acabam, mesmo se eu estiver com alguém até o dia da minha morte, as coisas vão acabar, pois existe a morte.

em segundo lugar, as pessoas usam categorias para dar inteligibilidade ao mundo delas. categorias como amigo, namorado, marido, mãe, cachorro.
mas categorias são sempre precárias, e nunca refletem uma realidade objetiva.

em terceiro lugar, o desejo é polimorfo. eu acho absolutamente legítimo que alguém deixe de sentir desejo por uma pessoa, ou acabe desejando mais de uma pessoa ao mesmo tempo, em diferentes níveis e intensidades (as coisas morrem!), assim como é possível que, em determinado tempo, alguém sinta desejo apenas por uma outra pessoa.
categorias, aqui, são iminentemente precárias, seu uso é estratégico.

pra mim, coisas como intensidade, reciprocidade, transparência, sinceridade, carinho são muito mais importantes do que qualquer outra coisa.

por fim, gostaria de te convidar pra participar mais da minha vida.

seria plausível que a última parte da explanação, por simples que fosse, soasse desinteressanteº

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Leigo não!

"A maior parte das obras de arte trai a poesia. Como poderia ser de outra forma já que a poesia e o poder são inconciliáveis?"
Raoul Vaneigem

Leigo não!

Pensei em começar me justificando. Mas me chafurdando voluntariamente na protocolagem de fazê-lo, contradiria-me. WhatEva, estive falando 'ses dia com um_ arqui-teta, num muquifo arrumado na 13 de maio (ou seja, dois dias depois do meu aniversário), também à luz negra das minhas incursões recentes a duas "grandes" exposições de arte "contemporânea" - como, no afã de historicizar essa produção artística residisse a busca possível por um conforto (não menos que precário) no mundo. Abrindo o fulcro - sutiã do argumento - o estado da arte me sugere encaminhamento para a polissemia abissal entre produtor e espectador de arte.

A persona dO artista como virtuose, [cronista ou vanguardeiro], cede hoje ao deslocamento da autoridade artística - por vezes encenada, que a crítica ainda opera construindo consensos, um tanto quanto esquizofrenicamente. A profissão de artista se abre conceitualmente, a crítica e o mercado reiteram a produção das diretrizes que definam _s artistas em termos de tendências estéticas e redes mercadológicas de circulação.

Pensando a história da antropologia, James Clifford retoma argumentos de Mikhail Bakhtin para pensar a produção da autoridade etnográfica no seio da disciplina antropológica. Se, metade de uma palavra, na linguagem, pertence a outra pessoa, isto equivale a reconhecer o quinhão de subjetividade implícito no diálogo entre produtor artístico e seu intérprete. Cito mais, inclusive outro trecho co-autoral
A recente teoria literária sugere que a eficácia de um texto em fazer sentido de uma forma coerente depende menos das intenções pretendidas pelo autor do que da atividade criativa de um leitor. Para citar Roland Barthes, se um texto é "a trama de citações retiradas de inumeráveis centros de cultura", então "a unidade de um texto repousa não em sua origem, mas em seu destino" ... A escrita da etnografia, uma atividade não controlada e multissubjetiva, ganha coerência por meio de atos específicos de leitura.
Parece que nos reencontramos entre um polo onde a relação de fruição e contemplação da obra chamada "de arte" se define por um processo plurívoco marcado pelas vicissitudes individuais do espectador e pela irreversibilidade da contemplação implícita no suporte expográfico (paradigma contemporâneo); e outro polo, onde as condições para a apreciação supõe uma sorte de embasamento previamente adquirido, o reconhecimento da figura legítima do artista como portador de um ethos essencialmente diferenciado do espectador, e o domínio de uma série de códigos que tornam possível a relação artista-obra-espectador.

Um exemplo surgido na conversa com _ arqui-teta: passar cocô na parede pode ser uma forma de estender o vínculo entre artista e o lócus de inscrição criativa; uma crítica à expografia; investigação de pigmentação; investigação metodológica aplicada à expansão dos sentidos na contemplação (meio John Waters); pós-pornô; détournement do establishedcollage mista, arte experimental, releitura fecal de Jackson Pollock, crítica política à territorialização fascista do corpo; nonsense etc. etc. etc.

Da mesma forma, a unha que eu descarto, no ímpeto ansioso da minha roeção cotidiana, ela própria, isolada, pode se transformar em uma metáfora da ação temporal (à la Damien Hirst), um happening pós-humano (à la Ana Mendieta), ou mesmo um deslocamento radical dos processos que conferem estatuto ontológico à obra de arte (à la Marcel Duchamp). Na verdade, qualquer coisa, na mão de um artista e de uma comunidade que o reconheça como tal, pode ser qualquer coisa.

Longe de restaurar um equilíbrio entre os polos da polissemia total e da crítica dinossaura, prefiro pensar em alternativas práticas e conceituais ao caolhismo que me tem assustado.

A minha experiência recente com o teatro tem me feito pensar sobre dois aspectos que me remetem a discussões empreendidas pelo situacionista belga Raoul Vaneigem em [atenção para o título] "A arte de viver para as novas gerações" - embora tod_s saibamos que o guru da arte de viver é aquele sadomasoquista francês careca soropositivo -, panfleto que circulou pelos idos de 1968 pelos desocupados estudantes da USP parisiense.

Em primeiro lugar, destaco um tópico referente à produção dos estatutos de "obra de arte" e "artista" na sociedade do consumo.
É sabido que a sociedade de consumo reduz a arte a uma variedade de produtos de consumo. E quanto mais se vulgariza essa redução, mais a decomposição se acelera, mais crescem as possibilidades de uma superação. A comunicação tão imperativamente desejada pelo artista é impedida e proibida mesma nas relações mais simples da vida cotidiana. De tal modo que a busca de novos modos de comunicação, longe de estar reservada aos pintores ou aos poetas, é parte hoje de um esforço coletivo. Assim acaba a velha especialização da arte. Já não existem artistas uma vez que todos o são. A futura obra de arte é a construção de uma vida apaixonante.A criação importa menos que o processo que gera a obra, que o ato de criar. O que faz de alguém um artista é o estado de criatividade, e não o museu. Infelizmente, o artista raramente se reconhece como criador. Na maior parte do tempo, faz pose diante de um público, se exibe. A atitude contemplativa diante de uma obra de arte foi a primeira pedra lançada no criador. Inicialmente ele provocou essa atitude, mas agora tenta desfazê-la uma vez que, reduzido à necessidade de consumir, depende dos mais grosseiros imperativos econômicos. É por isso que não existe mais obra de arte no sentido clássico do termo. Já não pode haver obra de arte, e ainda bem. A poesia reside em outro lugar, nos fatos, nos acontecimentos que criamos. A poesia dos fatos, que sempre foi tratada marginalmente, reintegra hoje o centro dos interesses de todos, o centro da vida cotidiana, que na verdade ela nunca abandonou.
A sociedade de consumo não processou exatamente a superação da arte como vaticinou Raoul. Tampouco a poesia superou a museologização e galerização da arte contemporânea. Resta fresca, no entanto, a utopia.

Em segundo lugar, me parece que a importância atribuída à criatividade (conteúdo, diríamos?) em relação à técnica (forma, talvez?) pelo autor me remete a uma dicotomia que me soa parcialmente superada. [E fonte de equívocos. Por exemplo, Raoul grilado apontava a pop-art e sua técnica reprodutibilista como consagração do consumo através da elevação do mercado a obra de arte, o que é uma ingenuidade.] No entanto, essa oposição entre força poética e técnica-alienante é estratégica na crítica de Raoul: a fetichização da técnica na investigação de arte equivale ao esvaziamento político semântico das produções artísticas, na sociedade de consumo. A poesia é a promessa de uma forma de assumir processos já em andamento, superando a oposição técnica/criatividade.

Pude enfim no meu contato recente com o teatro reencontrar uma forma de engajamento foda, tanto no que se refere ao questionamento dos supostos limites entre forma e conteúdo, arte e não-arte e, sobretudo, através da incorporação da crítica social. [Sempre, ironicamente, o teatro de arte, aquele cult, aquele pretensamente lado B, não-comercial - recusa a hegemonia, mas se esquece que o nicho mercadológico é seu sustento existencial. Todo lado B tem um lado $.] No entanto, praticar teatro (na atividade criativa de espectador e ator em devir) tem convergido para perceber e pensar o mundo de maneira afim com minha (de)formação de antropólogo: relação é simulacro, interação é teatro, e a separação entre uma esfera teatral e não-teatral é atravessada por um conjunto de estruturas, redes, coletivos, convenções e actantes, que define um domínio epistemológico da ficção e um da realidade. Tais domínios, definidos em oposição, são precariamente sustentados, e socialmente construídos.

Tais ideias vão de encontro com minha adesão a uma definição particular de arte - finalmente! -, que tem um fundo sócio-antropológico relacional e um sentido particular. Em primeiro lugar, arte é algo situado em um domínio específico a partir de um processo de purificação entre artístico e não-artístico. Este processo tem sido mediado por uma comunidade que, através de uma cadeia de relações complexas, define as diretrizes do que pode ou não ser considerado arte. Eu entendo que a arte tenha se processado de tal maneira na modernidade e, assim, naturalmente rechaço essa ordem das coisas.

Em segundo lugar, há um sentido que eu elejo arbitrariamente como tópico central em um debate concernente à artice, artismo, artidade. Isto é sobre o que se convencionou chamar política, e se refere ao engajamento do produtor cultural, do artefato produzido e de seu diálogo potente com o produtor-leitor. Este engajamento visa poetificar a vida cotidiana (meio à la Raoul, mas pensando sobretudo nos limites epistemológicos entre ficção e realidade - não estou falando do chatíssimo fetiche da metalinguagem) e, sobretudo, à transformação social - cujo limite radical é a arte-sabotagem de Hakim Bey. Sinto que esse é um norte que nunca desamparou a produção de "arte" - termo cada vez mais vazio -, e resgato em tópico essa necessidade como forma de dotar de sentido a minha própria relação com a produção artística.

Portanto, é disto que se trata este insulto organizado: o engajamento crítico e radical é, pra mim, o remédio ao mesmismo da polissemia total e à crítica burguesa da arte burguesa. Aliás, eu poderia inclusive dizer que esse é o tema do cocô na parede.


Duas esporradas:

James Clifford. A experiência etnográfica - Antropologia e literatura no século XX. Rio de Janeiro: 1998.
Raoul Vaneigem. A arte de viver para as novas gerações. São Paulo: Conrad, 2002.

domingo, 5 de outubro de 2014

pós-escritos de uma ressaca que não se reconhece como tal

...mergulha
à espera de um milagre
...a cabeça
...................de bagre


..esperança
..................que azucrina
chega de última hora
traz a ânsia
de conhecer minha sina
.........................agora
a esperança
.....de um dia ser
o último a morrer



rick 
you make me sick

van gogh
head is a fog



ensino colonizado

aulas de licenciatura
são tipo happenings
e as performers
são sempre tiazonas
elas sentam na mesa
e começam o stand-up comedy


....orgulho USP
no banheiro
.......da FEUSP
um beijo, um abraço
uma salva de palmas
sorrio
- agora volto pra aula


um dia eu vou ser grande
----você não tem noção
-----o quanto eu espero
.........deixar de ser EROS
---------pra virar EREÇÃO



pós-estruturalista posto em xeque

se a destruição é um ato de criação,
não me deixa desabar sozinho.
se os actantes e processos morrem,
me ensina a ressucitá-los.
se a linha em curso aniquila possíveis,
me diz que alternativas são viáveis em relação às lagrimas que verto.

no xadrez com a morte, sou a mosca no tabuleiro.
com mil olhos, vejo de maneira transversal as articulações na estrutura, capturo cada segmento do sistema, assistindo em perspectiva privilegiada um império assolar o outro.
alheio ao jogo, alijado de qualquer movimento, voo, voo, voo...
voo de casa em casa, mas em nenhuma delas você está.


esboço de auto-análise

acordo num Artacho Jurado
............Leminski na mão
..........Taiguara no ouvido
viro pro lado e dou um c'USP
via quatro
..........fato
.................que não olvido
...........quantos trabalhos de campo
............pergunto - teatro - no chão
pra eu me tornar Marcel Duchamp?


coração não tem reset
que é pra gente fazer música
e dar dinheiro pra Ambev


.......percebo
......................pedalando a esmo
.........se a noite ficasse mais fria
mais que da tua não-companhia
.............eu pudesse talvez espontâneo
...........virar noite de mim mesmo



segunda imagem do Hello Niti:
uma autoria extorquida