terça-feira, 30 de setembro de 2014

mazelas do acordar

posso ir e voltar pra lua quinze vezes pra sentar ao seu lado.
posso subir ao topo dos prédios mais altos de São Paulo ao seu lado.
posso te levar pra praia, e assistir ao nascer do Sol com vinho e um beijo terno.
posso te levar para um lugar nosso, fogueira, mais vinho, violão, você, nós dois.
posso te trazer pra dentro do meu coração, e te tornar o cara mais feliz do mundo.
posso ser avistado nu ao longe, enquanto você acorda calmamente em uma cama na praia da ponta.
posso gravar um álbum conceituado de rock contigo.
posso te apresentar a minha versão de muitos lugares, e empreender novas histórias geográficas, com tuas bandeiras.
posso fugir contigo.
posso me tornar um van gogh.
posso voar em um balão, segurando na tua mão.
posso tocar meninos e meninas quantas vezes você quiser, desde que você cante comigo.
posso aprender toda a história da filosofia, só pra te ensinar.
posso atuar e viver ao teu lado a mais bela história de afeto.
posso ser aquele cara que ninguém nunca foi pra você.

bah!
nada disso eu posso fazer.
quando a gente não tá afim, não rola.
resta sonhar um sonho danado.
de bom.

[acordar é difícil, mas inevitável]

domingo, 28 de setembro de 2014

acordar num dia que não quero

você me deixou sentindo tanto frio...

havia naquele intuito, aquele afã todo, uma coisa no canto - encantada -, uma renúncia obscena, uma (não) escolha escondida.
o espelho encardido me dizia, repetia meus maxilares gestos.
- acabou.
soava silêncio. mas era silêncio, afônica intenção de vida.
- acabou.
o silêncio saía e entrava em mim, era um vazio que preenchia de inocuidade a prova de inglês.
e no meio seco do silêncio, o eco aturdido se fez, da música que me infernizou durante pouco mais de um mês.
preciso de oxigênio, preciso ter amigos, preciso ter dinheiro, preciso de carinho...
a caneta traduzia Tim Ingold, mas meu peito transcrevia aquela letra, que confusamente transitava ao redor da minha cabeça disfuncional, larvas desbravando os orientes e ocidentes do pão cerebral.
olhei pra folha, rubricas confusas, assimétricas.
não sei mais o que dizer...
concluo, mnemonicamente informado, pois.
encerro o almaço, pro futuro, um abraço.
decidido, largo os passos - ao profundo dissabor dos setembrinos espaços. com o pouco que resta da vista miro um firmamento imaginário, evanesce com rara calma, fulgura num perto cada vez mais longe.
longe de mim mesmo, aviso que é de se entregar - o/u viver.
sabe?
vai ver que é assim mesmo e vai ser assim pra sempre...


PS: isso dá/eu leminskinho


prova de mestrado

encerro o almaço

pro futuro
um abraço


vai ficando complicado e ao mesmo tempo diferente...
tipo, pra ser bem sucinto, as coisas morrem, a oficina acaba etc., mas eu queria deixar registrado como isso tem sido importante pra mim. aí vai.

entre o afã de celebrar
e a esperança de seguir
e shakespear
------------------ar
que muita coisa resta ainda
que seja matéria de drama
essa vontade que se inflama
que seja quente feito chama
esse sorriso que se flagra
olhos vivos, bocas largas
no seio desta sala
que se desafie as fronteiras do leal
que desabe o real
que o mundo caia
bruno, rick, eugênia, somaya
vânia, lucas, rafa, bia
cabe todo mundo nesta minha poesia
que essa nossa paixão cênica jamais arrefeça
pois além de um domingos
gozamos da terça
dislaine, eu falo mais
quanta gente fina
que tem neste brás
não é, karina?
é necessário fazer uma média
pro nosso diretor
ah! até parece, por favor, né?
uma salva de palmas pro andré
e eu sou o eros
o deus do amor
perdoem eu ser brega
meu peito se entrega
e eu sou assim
no tchau do calor
a cena e o ator
leva um pedaço de mim
MERDA!


pássaros audíveis
-----------------na bela vista

madruga
------------voadora
-----------------------teimosia


seis da manhã na linha coral
um choro engasgado
parece normal

seis da tarde na linha turquesa
um riso nervoso
de rara franqueza

Biografia não-autorizada sobre um amor irreversível - Ato III

Eu idealizei este terceiro e último ato da seguinte forma. Tendo lido na minha companhia os atos anteriores, meu desejado efebo escreveria comigo a terceira parte. Tal perspectiva não soa como possível agora - pra mim, que nem mesmo sei como estou vivendo sem ele.
Caso ele volte pra mim, e o mundo inteiro é testemunha como necessito disto, o título deste texto virará "Intermezzo", e daí sim escreverei um terceiro ato decente para esta "Biografia não-autorizada sobre um amor irreversível".
No mais, é bom viver, ainda que chafurdando na lama. É bom se chafurdar numa lama que valha a pena.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Biografia não-autorizada sobre um amor irreversível - Ato II

acordaremos às vinte e três, sem pressa.
a casa ampla, arejada, portas abertas. cheiro de praia. o frescor fazendo cafuné em nossos rostos. lençóis desarrumados no meio da sala. se eu estiver com olheiras, não vai ser de tristeza ou cansaço, apenas marca do dia quente. sua pele reluzirá as fontes de luz, disputando seu reflexo.
pela primeira vez me contará de sua reação quando abriu o bilhete, "vamos fugir!". você já sentado no meio-fio da cama, após suavemente me carimbar os sulcos dos lábios na minha bochecha. nunca entendi por que seus olhos sempre brilham. permanecerão acesos quando evanescer? ou quando contemplar o aspecto plenamente inerte da minha silhueta sem vida? [chegaremos a esse dia?]
e o papel, que terá feito com ele? rasgou na hora, como faz com tudo que possa incriminá-lo. isso pode explicar por que, no receio de que avistassem numa palafita o rumo medíocre que a sua vida tomava, de súbito tomou a curva que deslizava rumo ao afluente inóspito, rasgando a terra. e cá está, comigo, agora, deste lado do canyon.
deixo você falar até o fim, eis por que sempre tolerei seu silêncio: apostando minha vida no escuro, por uma intenção de fala, por quantas madrugadas passei verborrágico esperando que ao menos sua cabeça se precipitasse nas palavras mais vulgares como "eu gosto de você". ou que, por falta de Shakespeare, você me respondesse em Leminski. mas vinha Walter Franco: um silêncio eloquente, mas machadiano. até hoje não sei se você gosta de mim (será injustiça dizê-lo? não me responderá). não sabê-lo, contudo, me mantém vivo.
antes que levante já o terei feito. bem fiz em te convencer a tomar a caipirinha. "faço bem suave". a resposta de sua explanação sobre o bilhete foi um sorriso bastante loquaz. eu te ensino a falar, você me ensina a ficar quieto. gesto eloquente, coisa de ator. numa dada ordem cênica diacrônica, um sorriso é capaz de perturbar todo um arranjo. nesse caso não houve incongruência: meu sorriso era a sua fala.
o meu sorriso inibido, agora por não esconder que desejo profundamente, virá acompanhado pela sua reação ao copo colorido de caipirinha: uma vertigem ambígua, seus olhos. você estará na sala, sentado apenas de samba-canção - tão vestido estará -, e de seus pés em comunhão resultará o dissenso dos joelhos, mirados em opostos.
o primeiro gole você tomará segurando o copo com as duas mãos, uma coisa meio Lolita. jamais pensei verossímil assistir a uma cena como esta quando li Nabokov pela primeira vez. ainda mais porque eu sempre fui acostumado a partilhar da perspectiva Lolita na vida.
se o futuro é irônico, que se dirá do passado? quando meu xx-xxxxx xxxxxxxxxx xxxxxxx xxx xx xx xxxxxxxxx garoto de programa - tática estranha para me sugerir a abertura da relação -, xxx xxxxxx xxxxxxxxxxx xxx xxx xxxxxx xx xxxxx xx xxxxxxxxx xx xxxxxxxxx xxxxxxxxxxxxxxxxx xxxx xxx xx xxxxxx. não só não soube lidar com tal xxxxxxx, xxxx xxxxxxxx xxx x xxxxxx profecia que se processou por tanto tempo na minha identidade. táticas de sobrevivência: xxx xxxxxxx x xxxxxxxx xxxxxxxxxxx, eu me agarrei à heterodoxia pornô-beatnik pequeno-burguesa. quando você é um pós-estruturalista ateu pederasta, fica mais fácil surfar nas margens xx xxx xx xxxxxxxxx xxxxxxxxxxx.
nos entreolhamos. "quanto tempo demorará até que nos encontrem?", é o que penso. você parece pensar em coisas mais difusas, algo trivial como "quem passeará o Black?". Black é um cachorro preto de pelos lustrosos, gordo. "tá boa a caipirinha?". ele assente. passou meia hora desde que acordamos.
"você não tem medo de assalto?". ele sabe a resposta. há certo tempo venho lhe dizendo que o risco é parte inexpugnável da experiência humana, fato que celebro. eu pinço seu lóbulo com meus dentes, ele puxa pela ponta um lençol para cima de si. pintura impressionista nos seus olhos - impressiona a quem quiser ver. um Van Gogh - que não era impressionista -, um moço de pele mascavo e sobrenome Van Gogh, de volta para casa; não Amsterdã, onde foi fecundado, mas a praia temperada onde viveu começos da vida.
de repente o vento forte - posso ouvi-lo passar. você, afeiçoado que é a uma certa ordenação dos arranjos cotidianos logo solicita o fechamento das portas, pedido que eu, indolente como se poderia esperar, me recuso a atender. em troca, calafrios e a ternura dos seus olhos contrariados pela brisa e pela minha manha. tudo de mais importante que eu já conquistei na minha vida foi trazido pelo vento. falta de movimento é sinal de malogro.
eu, cagão como sempre, te esperei na rodoviária com duas malas exuberantes e desnecessárias - convertidas em uma comportada valise logo na primeira etapa da viagem. você, de pirraça com minhas expectativas - como sempre -, veio, com uma mochila compacta, "que desapego!", pensei. lembrei depois quando você ia pro curso de teatro apenas munido da carteira - e das peças de roupa por vezes indesejadas, apesar de deslizarem suavemente pelos seus belos ângulos e curvas. naturalmente, nada duraríamos sem a aquisição urgente de um violão, este que toca agora.
o mar - esse sim nunca dorme - acompanha em background a melodia. meus suspiros incansáveis, somatória ao cálculo sonoro. me lanço no chão, um mergulho, queda livre contra o estrado de madeira, minha manobra favorita no teatro. o chão, meu céu. me desabo porque minha boca quer ter com seu pé - aquele, o mais imune ao ritmo que inscreve nos movimentos e no instrumento. nada muito agitado, você é fã de uma lisergia escorrida. juntos, lábios e língua deslizam desfiladeiro acima, tantos pelos, que prazer contá-los um por um, penteados pelas minhas membranas úmidas. arranco-lhe de súbito o violão, destilo com a arcada dentária um feroz abocanhar sobre o pobre e vulnerável joelho. grita alto, aquela voz que sempre emudeceu a minha.
o método mais eficaz de fazê-lo permitir a si mesmo um pouco de paz na cama, é também uma forma de pactuar com o deleite. sua porra tem gosto de lichia. livre da aflição da - suposta - sujeira, ele me autoriza a, nutrido pelo seu saboroso esperma, depositar meu rosto sobre sua barriga, meu nariz passeando ao redor do seu umbigo, aponta para a virilha. "mais uma?, pergunto me referindo à caipirinha. me responde com um longo beijo. outra resposta enigmática. decido me engajar no preparo do próximo drink.
eu pude deixar cartas, avisar os próximos etc. você, que nem próximos tinha, só deixou pairar uma certa desconfiança em relação à progenitora. não que você atuasse mal. ela que tem o grande mérito, de possuir faro canino, escuta hipersônica, faculdades dedutivas e propriedades oculares extraordinárias, lentes microscópicas e espaciais.
acordo - sobressalto, onde você está? suas coisas estão aí, espalhadas, que nem minhas cabeças, poeira acumulada em cantos abstrusos, zumbido impertinente do mar. sigo o vento. de camiseta você fita o longe com admiração. quase não há luz, mas dramatiza a audiência das ondas. três e meia da manhã. vacilo rapidamente, processo a logísica em inifinitesimais, à espreita. o rapto se processa por trás, você se surpreende como se o firmamento no horizonte se entortasse. "a gente fodeu?". você responde afirmativamente com um sorriso pouco receoso em admitir um grande volume de desejo na superfície da vida. "sim". "de novo?". ri desejoso, desejante. "sim". levanto você e, como de costume, arremesso sobre alguma superfície, não sem seus deliciosos murmúrios de protesto - que nunca me tornaram menos piedoso. pressiono meu corpo sobre o seu, no colchão prostrado e estratégico. em segundos você nos conduz em espirais para além da superfície de pelúcia, plano sólido parcialmente forrado por uma tapeçaria de gosto dúbio. compartilhamos o gosto pelo chão.
durante um daqueles dias paulistanos, em um desses embates no plano baixo, olhei para o fundo mais fundo de seus olhos brilhantes, como agora, e disse "lindo!". você, como de praxe, respondeu "idiot!". mais tarde, na despedida, lhe disse "eu tenho vontade de falar tanta coisa pra você...", e então você me respondeu "quando eu como uma banana, eu não digo pra ela 'você é linda!'", mas, meu caro pintor neerlandês, acontece que eu nasci depois de coisas chamadas surrealismo, dadaísmo e performance e, pra mim, uma banana pode ser elevada a estatuto de obra de arte - que, segundo o paradigma da arte contemporânea, se oferece de maneira interativa para o espectador. seus países baixos são arte conceitual, apenas me dê o manual de instruções e saberei o que fazer. é uma questão de fé cênica.
de pé, a pia nos espia, você toma a terceira caipirinha com uma avidez que eu não reconheci. "você tá meio duchamp hoje?". você, caçando pistas na memória, a piada é familiar. claro!, você é o autor!, "por quê?". "porque o que você faz... não faz sentido, mas é arte!". você ri. "idiot!". Idiot, idiot, idiot! eu sou um idiot. todo dia, quando me olhar no espelho, vou me lembrar que eu sou um idiot, um tecnocordeiro obcecado, que, para o Schianberg de Marçal, faz parte de uma 
ínfima minoria, integrada por monges trapistas, alguns matemáticos, noviças abobadas e uns poucos artistas, gente conservada na calda da mansidão à custa de poesia ou barbitúricos. um clube de dementes de categorias variadas, malucos de diversos calibres. gente esquisita, que vive alheia nas frestas da realidade. só assim conseguem entregar-se por inteiro àquilo que consagraram como objeto de culto e devoção. para viver num estado de excitação constante, confinados num território particular, incandescente, vedado aos demais. uma reserva de sonho contra tudo que não é doce, sutil ou sereno.
"é o mais próximo da felicidade que podemos experimentar", conclui o autor.
na noite que antecedeu a partida, um breve encontro para determinar como processaríamos o plano. na despedida, seus braços se abriram qual um tríptico, me abraçaram com três retratos diferentes. em um, seu interior, povoado de tantas maravilhas, doces, exóticas, infernais, qual Bosch. noutro, o medo estampado no rosto do revolucionário em Madri, segundo Goya. no outro braço, a loucura obsessiva e exuberante de um van Gogh no Auvers-sur-Oise. senti, com alívio, pela primeira vez, que havia alguma fantasia naquela realidade toda.
"vou te embebedar", ofereço uma taça de conteúdo roxo, você e essa mania de ficar vestido, o pretume do céu anuncia desgaste. "de porra?". "iogurte de lichia". nada move nos rostos, apenas gargalham os olhos. então sorrio ternamente pra você, aprendeu a beber vinho seco, me fixo em cada detalhe semi-púbere. você, como de costume, não me encara de frente, cão tímido-espalhafatoso, embora saiba que minhas retinas querem penetrar cada canto da sua alma. pequena garoa.
qualquer coisa intimidava, né? uma garoa cotidiana era sinal de malogro. mas esta garoa que acompanha o alvorescer não nos intimidará. tá aquela coisa meio escura, meio molhada, meio cinco e meia da manhã. foda-se! atravessamos as árvores, a areia escorregadia e úmida, o orvalho da manhã. eu. você. a praia. o vinho. espero que um dia possamos fumar um baseado juntos. trocamos nossos sinônimos, olhares não mais anônimos, um segundo, dois segundos, a risada é inescapável - demais as coisas que pensamos. rio ruidoso, você não tão expressivo como eu, entendo alguns de seus limites, mesmo porque sei que a ternura quente do seu rosto reflete uma polifonia cardíaca. estamos juntos. beijo suavemente seu pescoço sempre perfumado. penso em falar aquela coisa, será que digo? sempre me esquivei de clichês, você sempre se confortou longe deles também. melhor não, sem metalinguagem, vamos curtir o momento, concluo, vou lhe dar um beijo, a chuva aumenta a contragosto da claridade celeste encaminhada, e eu diria que teria sido a vertigem do vinho, o canto confuso das ondas, o tilintar dos pingos na areia ou a tosse amarga dos quero-queros, se não tivesse sido tão nítida a recepção da sentença pelos meus ouvidos. "eu te amo".
isto, gatinho, é sobre nascer de novo.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

sem título (pequena poesia ruim-rimada, embora honesta)

será o caso de me desculpar
ou acaso, um jeito de me expressar
a poesia, que apesar da noite quente
soa tão fria, pois notando que estás ausente
em segredo marca a tinta o medo
na folha de papel vazia?

você deve estar cansado
de lembrar
que o meu jeito de gostar é no cuidado
que eu estou marcando bobeira pro mestrado
você vai me desculpar
se eu tô fazendo algo errado?

me desculpa por eu gostar tanto de errar
caso contrário não me chamaria Eros
perdoa por achar que tens que me perdoar
e, sobretudo, perdoa por eu ser tão sincero

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Biografia não-autorizada sobre um amor irreversível - Ato I

I

eu virei pra minha life-mate e disse algo que poderia ser traduzido como;
não basta ser lindo, também toca piano.
pensei, 'pena que ele não gosta de meninos'.


II

pra ele o flerte começou quando ele me viu ao longe trocando de camiseta.


III

à noite, na casa de um amigo, vi, dentre outras coisas interessantes, sua foto de franja. pra mim o flerte começou aqui.


IV

20 de agosto de 2014
"Iae - 10h14
"Dei uma olhada no teu face ontem! Você toca baixo né? - 10h15
...
"Eae - 11h48
"Pqp, vc viu aquele vídeo... Hahah - 11h48


V

"To procurando uma banda, cara... Sempre quis ter uma - 14h08
Na minha cabeça, o Arnaldo Batista disse, "seria o maior barato tocar seu coração".


VI
VoiceNote: "Olha, eu acho que bom gosto é uma coisa bem relativa, sabia? - 14h26
...
VoiceNote: "Ah! Sem dúvidas, o que é bom gosto pra mim pode não ser bom gosto pra outra pessoa. Mas o que eu quero dizer é que, dentro dos meus padrões, o seu bom gosto é bom gosto pra mim - 14h30
Completamente ganho. Será que ele curte meninos?


VII

VoiceNote: "Aí sim hein, foi legal o dia? Ah, como você pode 'tar percebendo, tô tomando banho pelado - 21h44
UÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁAAATTT


VIII

22 de agosto de 2014
"Ensopado de suor, haha - 12h17
"(Esteira. Agora são os pesos) - 12h17
...
"Hahahah mds - 12h26
"15 min e já ta suado? - 12h26
"#NoPainNoGain cara - 12h26
(...)
VoiceNote: "Não, mas seu nome de guerra na Augusta pode ser Gui, sem problema - 12h23


IX

Almoço com duas grandes amigas e uma visitante da Paraíba. O tema é ele.


X

Ele se queixa de cansaço. Digo
"Kkkkkk ia bem uma massagem - 14h47
Ele responde
"Ooooorra. Tô aceitando viu - 14h48
Eu
"Rs - 14h50
Ele
"^^ - 15h00


XI

Foto minha com meus amig_s. Ele diz
"Gatos :3 - 17h14


XII

Ele me explica que "favorável" é uma gíria de funkeiro pra denotar algo positivo. Tudo o que eu mais passei a desejar era a chance de ser favorável ao seu lado.


XIII

Na casa de um cliente. Não acredito quando ouço a VoiceNote enviada às 19h43
"São Sebastião, e eu gosto de meninos e meninas. Vai ver que é assim mesmo e vai ser assim pra sempre.
A música me atormentou durante o programa, e o resto da noite.

Entre as 22h51 e 00h13 do dia 23 de agosto de 2014, rolou isso:
E - Curto aquela musica
¢ - Meninos e meninas?
E - Sim!
Curto legião, inclusive essa música
Acho que gosto de são paulo 
Gosto de são joão
Gosto de são francisco
E são sebastião
¢ - E eu gosto de meninos e meninas
Legião eh foda, incomparável
E - Música daora! Haha! Bebi um pouco, estamos voltando pra casa
(...)
Agora tô com a música na cabeça
¢ - Hahahahha
Quando eu canto o refrão alto, minha tia fala
"Osh, quer dizer que vc é bi?"
E - Hahahaha!
[E o que você responde?]
¢ - - Sou mesmo, tia. Aceite
(...)
Ela fica puta
E - Hahaha! Posso imaginar. XD
Minha mãe não fica mais puta quando eu falo sobre meninos. Hoje me dia ela acha até legal. ;D
¢ - Hahahah, fala sobre meninos...?
E - Nah! Você entendeu! XD
¢ - Hahhaha, entendi mas queria entender melhor hahab
(...)
E - Não entendi o que quer 'entender melhor'! XD
(...)
¢ - Ah... Quero entender melhor essa parte da sua vida hahah
E - Nah!
Qual? Que eu gosto de meninos?
¢ - Isso
E - Ué! Que tem pra ser dito? XD
¢ - Isso tu que deverias saber kkkkkkk
Mas eu sério, e jamais imaginei
E - O quê?
¢ - Q vc curte garotos
E - Rs... vice versa
¢ - Hahahaha precisa de convivência, mas pouco
E - Hahahaha! Você curte meninos então? XD
(...)
¢ - Sim kkkkkk

Nesse instante, eu peguei minha bike e dei uma volta no quarteirão apenas de cueca.
Sem zueira!


XIV

Por volta da uma da manhã ainda do dia 23.
¢ - É que eu realmente estou chocado hahaha
E - Chocado com o quê?
¢ - Sobre isso kkkkkk. Você tem voz e jeito nenhum pouco peculiares
As vezes eu consigo deduzir quando a pessoa é ou não kkkkkkk.
E - Hahaha! Acho que esse negócio de dedução muitas vezes falha, viu?
Mas eu também fiquei encasquetado em relação a você

Eu fiquei louco, na verdade!


XV

Uma e meia.
E - Mas você tem razão, muito difícil encontrar gente nova com papo interessante. Aliás, eh difícil encontrar gente com papo interessante de qualquer idade u,u
¢ - Kkkkkkkkkkkkkkkkkkk
Infelizmente eh verdade
E - Bom... devo dizer, errr... que eu acho você... err... bem interessante...
Aaaaaa hora de durmir, né?
¢ - Bem interessante?
Kkk, em que sentido?
E - Zzzz
¢ - Não foge não
E - Olha....
Rs..
Em vários sentidos
Nahhhh
¢ - U.U
E - Mas dxa quieto
Melhor dormir :///
¢ - Poxa, obg kkkkk
Nãooo
Deixa quieto oq? Haha

Finalmente disse, depois de muito tempo, que achava ele Gatinho. Ele foi modesto... Mas revelou enigmaticamente.
¢ - Você me fez lembrar da ultima terça
E - O quê?
¢ - Quando vc estava se trocando e eu olhei pra você hahaha sem querer

Disse que não quis assustá-lo. Ele disse que eu tava falando merda.
Nossa conversa acabou às 2h33.


XVI

Não consegui dormir direito. A música e ele me assombravam. Acordei - pela última vez - às 8h. Uma hora antes da oficina já estava lá na lanchonete na Rangel Pestana. _s funcionári_s assistiam ávidos um desenho animado. Eu, já conversando com ele, só conseguia pensar na música. O convidei para um rolê domingo. Ele aceitou.
¢ - Então qual era o problema em dormir?
(...)
E - Sei lá. Eufórico, ansioso, não sei...
E, ah sim!, sonhei com aquela música! !!! Juro?
Já sonhou com música? Eu já sonhei com algumas XD
(...)
¢ - Ansioso...
Como foi esse sonho? Kkkkkk
E - Hahahaha sei lá

Eu sabia muito bem como tinha sido.


XVII

Ele fala sobre Prokofiev. Ele quer que eu convide minha life-mate. Nenhum de nós três honestamente a quer no rolê.
VoiceNote: "Sei lá, por mim de boa... Eu acho - 22h

Ele me manda aquela foto sem camisa, que eu qualifico de "mancada"...


XVIII

VoiceNote: "A sua voz é muito bonita, sabia? Sei lá...
...
VoiceNote: "Não, não é não, mas, se você acha, 'brigado!
(...)
VoiceNote: "Que bonitinho ele cantando... Nada a ver! Vou tomar um banho e jajá te dou um tchau!
...
VoiceNote: "Ah, vai te catar, Eros!
(...)
VoiceNote: "Eu mandei você se catar, pelo simples motivo de que você estava me constrangendo falando sobre eu cantar a música!


XIX

André e seu amigo enigmático apareceram às 5h em casa. E eu só queria dormir, pro tempo passar mais rápido. Não deu certo.


XX

Acordo no dia 24 de agosto de 2014.
Estou explodindo por dentro. Sem fome alguma. Meu estômago briga consigo mesmo. Como pães de queijo e tomo um dollynho... Pela metade. Compro oito chocolates para presenteá-lo. Vou encontrá-lo, estou no metrô. Ele atrasa uns quarenta minutos. Quando aparecer, é que tenho uma missão, que eu não sei bem qual é. Sou todo desejo. Quero explodir.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

O puto e o capitalismo: Percursos da hipocrisia

Este texto ia ficar guardadinho. Melhor não!

"O que não falta é militantizinho de esquerda fazendo esse discursinho falso moralista, né? O problema do Brasil não são as drogas não, é uma coisinha chamada hipocrisia, tá bom? E hipocrisia não se bebe! Hipocrisia não se fuma! Hipocrisia não se cheira!"

Rafucko está certo. Parece que por aqui (aqui é muita coisa, decerto) a opressão tem todo um jeitinho, um consenso sem consenso, uma compensação desequilibrada.
Acho que conheci um lado da hipocrisia muito B. Talvez C, de Coxinha!
O falso moralismo de esquerda a que se Rafucko se refere em "O desabafo da cocaína" é essa história, de defender o fim das opressões, o fim do capitalismo e o escambau, e daí todo mundo tem namorad_, casa na igreja e no civil, aposta na sacralização do corpo - de um corpo que resiste e sucumbe sistematicamente à sacralização -, chama de pós-moderno tudo aquilo que refutar o pilar materialista da teoria revolucionária trotskista, interpela com o dedo em riste aquel_s que desafiam sua epistemologia com as mesmas mãos que Althusser usou estrangulando sua esposa em um surto psicótico em 1980.
[Esse mesmo dedo que acusa ferozmente, mas que omite a vida sexual do autor d(o libelo evolucionista)e "A origem da família, da propriedade privada e do Estado". Gente, o Engels é a cara da controvérsia!]
Eu estou de acordo com o manual pós-estruturalista: "O pós-estruturalismo rompe com o marxismo, mas trabalha com Marx" (James, 2005). Olha só, isso não é um método, é uma constatação: as pessoas apenas trabalham com Marx, embora acreditem estar fazendo marxismo.
O que resta de uma esquerda que, sentindo-se amparada em uma epistemologia-foice-martelo - que de confortável nada tem -, vaticina um futuro que se envereda a partir dos motins julinos e dúbios de 2013?: desabam os pilares da sociedade de classes, e as pautas são disputadas em franca queda d'água do desejo que irrompe das massas. Mas a única coisa que é franca é a ingenuidade generalizada, uma ingenuidade desigual e combinada.
[O que interessa pra mim não são as correlações de força d_s partidári_s, mas daquilo que se convencionou chamar relações de poder: não é o conteúdo dos panfletos traduzido em estatística, é o preciso: é o que fazem os panfletos! o que fazem as estatísticas!]
Detalhe: essas pautas não são putas. As pautas são insensíveis ao reconhecer o sopro cáustico das multidões de tecnocordeiros - aquel_s que, de acordo com Bia Preciado, se apropriam de tecnologias de produção de subjetividades. A minha pauta é honestamente atenta à opressão PUTA: Partido Ultra-Tesônico do Amor; Posso Usar Todas as Armas, Prostituto Urbano Teme Acéfalos.
Tudo que é aparentemente sólido destrói-se em um jato de $êmen quando se olha para um problema como o da prostituição masculina. Existem lupas - que a Nancy Fraser achou jogadas lá pelo início dos anos 1990s - que enxergam o patriarcado e o heterocapitalismo. Há lupas que enxergam sexismo e hegemonia. Há lupas que enxergam heteronormatividade e différance. Mas a minha lupa, furta-cor, enxerga tudo isso junto, e mais um pouco, e distorcida, por favor!
A minha lupa tem tons de Perlongher, uma bicha que soube muito bem trabalhar com Marx para produzir artefatos culturais severamente cáusticos, mas de cujo uso é subestimado dentro dessa esquerda falso moralista.
Ele poetifica, teorifica (1984):
Insistimos em remarcar a precariedade desse contrato. (...) Esta conversão de intensidades libidinais a quantidades econômicas conforme atributos possíveis de serem agrupados em séries de oposições binárias que, resumidamente, se processa no negócio do michê, todo esse complexo dispositivo de trocas microscópicas, moleculares, no nível das sensações corporais, funcionaria transparentemente se não estivesse LAMBUZADO PELA PAIXÃO.
Essa suposta modernidade em que estamos, em que (rei!) o capitalismo regula, monetiza, territorializa corpos, práticas e zonas, suporta também linhas de fuga que desafiam a lógica da burocracia, a lógica das territorializações heteroterroristas do desejo, a lógica do contrato, a lógica da profissão e da clientela, a lógica do gênero e da "orientação sexual",
PORQUE CRIAM DESAFIANDO A REGULAÇÃO CAPITALISTA,
com aquilo que é a própria matéria-prima (matéria-das-prima) das opressões molarmente organizadas (hegemônicas).
Capazes de decorar o manual de instruções, não podem ver como o brinquedo se oferece com outra mecânica, porque são incapazes de enxergar dois palmos à frente do rosto: a prostituição masculina não é só lumpemproletariante ou contrarrevolucionária, mas é uma bricolagem gerada no seio de relações complexas e esmagadoras (como a disciplinarização dos corpos, como a capitalização do gesto, como o sistema sexo-gênero, como a exploração da mais-valia a partir do trabalho humano abstrato transformado em valor de troca), que na prática expressa outra coisa: falamos de genuína e notável AGÊNCIA!
Ando a Galope por Espaços Nodais na Companhia da Inteligência Anal.
Opor-se à prostituição feminina acusando-a de conluio com o patriarcado e situando as mulheres como meras vítimas da objetificação e exploração do corpo feminino, é sobre-estimar a sujeição das mulheres e negar a agência incrível que se enreda nos meandros da prática  de puta.
Como, a partir da perspectiva do patriarcado, interpretar a prostituição masculina, senão como extensão de uma sociedade doentia pautada pela valorização do homem em detrimento da mulher? Como um ritual de consagração do machismo! Exército de reserva - reserva de porra!
O puto faz uma coisa incrível: ele é pura encenação, pura performance, sua masculinidade é iminentemente prostética! (Estou falando do putanhismo que conheço - e pratico.) O puto aciona marcadores de masculinidades distintos/as para alcançar efeitos distintos, que o conduzam ao sucesso financeiro! O puto sabe que seu corpo e sua apresentação impactam seus clientes. Sabe também da quantidade infindável de micro-nichos mercadológicos a partir dos quais a plasticidade (versatilidade) desse corpo torna-se objeto de interesse. Um puto não é uma mera mercadoria, ele é mercadorias mil!
O puto tem chance de bloquear, evitar ou ultrapassar mediações. Se na ausência de regulação profissional reside iminente precarização do trabalho, o puto pode escapar das mediações burocráticas e controladoras do Estado! Suas plataformas de trabalho (a rua, a web, a sauna) tendem a permitir com que barganhe no corpo a corpo. A conversão do tesão em moeda é lambuzada pelo desejo! O puto processa uma tarefa de utopia urbana: ri do capitalismo no seio do capitalismo! Faz no tête-a-tête aquilo pelo que ciência da propaganda passou a ser obcecada no século XX: monetariza subjetividade, transforma representação em cifra.
Com uma mão o puto se rende aos anseios dos megalomaníacos e das reconstruções culpáveis (Hocquenghem), mas com a outra esfaqueia Pasolinis, circula por mundos que passam a ser autorizados, maneja um capital-sexo, capital-homossexual, capital-puto.
Capital-puto: ter acesso a bens, referências, pessoas e lugares a partir da subjetividade em devir-puto. Não fosse puto, este puto que aqui serve de referência jamais teria vivido coisas, consumido coisas, se transformado em coisas.
E jamais teria descoberto ser possível viver com uma renda gratificante, com tão pouca carga de trabalho. E o melhor: sinto, como uma forma de justiça de classe - e por que não, de gozo -, júbilo em tirar (não pouco) dinheiro do vício pervertido de engenheiros casados, profissionais liberais, jornalistas bem-sucedidos, empresários e moradores dos bairros mais caros de São Paulo.
Pois é, para satisfazer seus desejos mais podres, o playboy de Perdizes, escravo das rígidas convenções sociais de seu meio, me dá trezentos paus pra que eu o chame de putinha enquanto ele chupa o dedão do meu pé. Enfim...
Vender-se não é uma vergonha! Posso atestar isto de dois modos. Em primeiro lugar, o puto, diante da lógica capitalista, não é mais ou menos contribuinte da opressão - senão existe em função de uma série de opressões. Até onde eu sei, no capitalismo, as coisas e as pessoas são passíveis de serem capturadas e agirem como mercadorias. A força de trabalho, naturalmente, passa por essa captura. Então os gestos e actantes convivem num regime de devir-mercadoria. O puto não é menos colaborador do capitalismo e da mercantilização do desejo e dos sentimentos que o operador de telemarketing, o alto executivo e o funcionário público.
Como se, cultivando determinada carreira, se estivesse mais próximo da transformação da força de trabalho em valor-moeda. Isto não é apenas uma aberração teórica. É como se determinada forma de mercantilizar a força de trabalho fosse mais pró-capitalista do que outra. E é também ignorar que, no seio da sociedade do espetáculo, todos os sentimentos são passíveis de mercantilização - e a captura da sensação é o bem mais precioso da pulsão capitalista no processo de "supermodernização".
Mas, se o puto não está isolado das "mazelas do capitalismo", ele pelo menos, em potencial, e como qualquer operador de telemarketing ou alto executivo, possui uma propriedade da experiência-vida chamada AGÊNCIA.
Agora Gongarei Esse Nojento, Coxinha e Ignóbil Argumento.
Assim, é curioso mesmo que se acuse _ prostitut_ - profissão que resiste à história da luta de classes, tanto quanto a do funcionário administrativo - de conluio com o capitalismo, sendo que na contemporaneidade existem formas bem mais capilarizadas e tentaculares de divisão do trabalho (como a existência do quatermiére - a pessoa que, na França, era incubida de que um jantar não tivesse treze pessoas - mencionado por Simmel no início do século, um exemplo de profissionalização possível na cidade grande, o que um marxista caolho chamaria de mercantilização da superstição). Temos o diagnóstico de que a sociedade capitalista é - ironicamente - anti-essencialista (de acordo com Antonio Negri e Michael Hardt, para os quais a produção de identidades híbridas acompanha a produção de um mercado-alvo em devir). Mas o trottoir dos michês de Néstor opera com desterritorializações e reterritorializações, desafiando a lógica de enraização arbórea do capitalismo burocrático, fazendo brotar criativos rizomas ao redor das territorializações molares do desejo e do trabalho.
Em segundo lugar, vender-se não é uma vergonha não apenas porque todos são - compulsoriamente - vendidos, mas, e isso descobri quando me assumi viado, porque cair na corredeira do controle resistindo à linguagem hegemônica requer força. E uma espécie de dignidade - fictícia, claro, mas estratégica.
É preciso ter orgulho de resistir às correntes da estigmatização, patologização e disciplinarização do corpo. Eu tenho orgulho de ser viado, eu tenho orgulho de praticar pegação, eu tenho orgulho de fumar maconha, eu tenho orgulho de ser capaz de adestrar meu desejo. Triste ver como o michê - assim como o soropositivo, a puta, o viciado, o compulsivo - observa organicamente a criação de um armário particular. E, como os demais armários, você pode ser lançado violentamente de dentro pra fora, e sua subjetividade pode tornar-se vítima de territorializações escrotas.
E, fui ensinado recentemente - uma referência da política anti-racista estadunidense -, é preciso ser angry. E eu cultivo esses dois sentimentos - orgulho e raiva - dentro do meu peito. Eles são prerrogativa da minha existência. E não há abuso policial, homofobia institucional ou falso moralismo de esquerda que vá me fazer dobrar às minhas convicções políticas. Estas, felizmente, são informadas por uma bricolagem de experiências e referências que me permitem pensar em formas de agenciar meu corpo para além das mazelas do capitalismo.


Gozaram na minha cara:

ANTONIO Negri e MICHAEL Hardt. Império. Rio de Janeiro: Record, 2006.
BEATRIZ Preciado. Biopolítica del género - La invención del género, o El tecnocordero que devora a los lobos. S/d, disponível na web.
GEORG Simmel. "As grandes cidades e a vida do espírito". In: Mana, vol.11, n.2, 2005.
JAMES Williams. Pós-estruturalismo. Petrópolis: Vozes, 2013.
NÉSTOR Perlongher. "Amor e comércio na prostituição viril". In: Anais da Associação Brasileira de Estudos Populacionais, 1984.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

A morte que eu quero pra nós

Distante no espaço. Menos a ambientação da cena do xadrez com a morte no filme do Bergman; mais a cumplicidade da representação de seu predecessor. A certeza do fim, aqui na sua frente, a caveira sorri na sugestão da curvatura da mandíbula, mais ou menos como aquelas insuportáveis e insistentes fotos de cachorros sorridentes.
Na cena não decidi ainda quem é a morte. Penso primeiro que você. Do alto dos seus um-meia, soam tão distantes meus dois-dois. Sua escolice me faz reviver temas e tons da minha vida pré-universitária. Seu aparente vigor me faz fazer pensamentos: o que fiz com meu tempo?! Ainda bem que bem dele usei. Fui muit_s com vári_s, criei, produzi. E hoje tenho muito orgulho das minhas vergonhas. Ao mesmo tempo o tempo que, bom tempo que é, me lembra que a cadeia dos meus possíveis dilacerou em ácido as demais alternativas. Mas que bom ser jovem - embora, bem saiba, a morte não faça distinção etária.
Depois penso que sou eu, que quero ser o prenúncio (prepúcio?) de dias felizes, e pelo menos o prelúdio da sua vida mais brilhante e mais autêntica, que na verdade esconda minha putrefação sob negro capuz. Com minha antropologice, desconstrucionice, anti-capitalice... Boemismo, putismo, noitismo... E outras coisas com sufixo de podrecismo. Mas sabe?
Por que não duas mortes então? Triunfantes, decididas, hesitam no duelo porque não podem vacilar... Por que não romeu-juntas, levando os infelizes que comeram o musse de salmão estragado?
Que melhor e mútua ventura nos ofereceríamos, que não enfim coadunarmos enquanto morte, matarmo-nos de amor?