quarta-feira, 3 de setembro de 2014

A morte que eu quero pra nós

Distante no espaço. Menos a ambientação da cena do xadrez com a morte no filme do Bergman; mais a cumplicidade da representação de seu predecessor. A certeza do fim, aqui na sua frente, a caveira sorri na sugestão da curvatura da mandíbula, mais ou menos como aquelas insuportáveis e insistentes fotos de cachorros sorridentes.
Na cena não decidi ainda quem é a morte. Penso primeiro que você. Do alto dos seus um-meia, soam tão distantes meus dois-dois. Sua escolice me faz reviver temas e tons da minha vida pré-universitária. Seu aparente vigor me faz fazer pensamentos: o que fiz com meu tempo?! Ainda bem que bem dele usei. Fui muit_s com vári_s, criei, produzi. E hoje tenho muito orgulho das minhas vergonhas. Ao mesmo tempo o tempo que, bom tempo que é, me lembra que a cadeia dos meus possíveis dilacerou em ácido as demais alternativas. Mas que bom ser jovem - embora, bem saiba, a morte não faça distinção etária.
Depois penso que sou eu, que quero ser o prenúncio (prepúcio?) de dias felizes, e pelo menos o prelúdio da sua vida mais brilhante e mais autêntica, que na verdade esconda minha putrefação sob negro capuz. Com minha antropologice, desconstrucionice, anti-capitalice... Boemismo, putismo, noitismo... E outras coisas com sufixo de podrecismo. Mas sabe?
Por que não duas mortes então? Triunfantes, decididas, hesitam no duelo porque não podem vacilar... Por que não romeu-juntas, levando os infelizes que comeram o musse de salmão estragado?
Que melhor e mútua ventura nos ofereceríamos, que não enfim coadunarmos enquanto morte, matarmo-nos de amor?

Um comentário:

LM disse...

O amor é mesmo a morte, é como "estar no inferno ao som da ave maria"