domingo, 27 de junho de 2010

Amor Irreversível III

Eu tenho o péssimo defeito de não saber de cor as letras das músicas da moda. Depois de ancorar no porto seguro (olhos, um par de botões) me resta apenas determinada simpatia e um fascínio de sociólogo sobre o que é este êxtase artificial e celular no qual esta galera moderna é viciada.

Te falar que não me exerce fascínio é te assumir alguma medida de hipocrisia. Meu rapaz, essas coisas são gostosas, eu sei. Sabes também. Não o negaremos. Mas até agora o que me resta é simplesmente a curiosidade sociológica. Descobri o amor na porta das manhãs, foi à tarde, e eu o estou vivendo nas barbas da eternidade.

Amo irreversivelmente. As senhoras sentadas em estrelas despencaram terrivelmente. As cores que pediram a conta do analista voltaram; estão quase em alta. Tirei do freezer algumas das estrelas. A cidade tem feito por merecê-las. Se minha felicidade tivesse um nome -e seria maldoso da minha parte batizar um sentimento imensurável, mas estamos falando de estética-, seria Eduardo. Nome de uma felicidade eduarda.

Eduardo, guardião das riquezas, virará o meu adjetivo predileto: qualidade daquilo que guarda as riquezas. O meu coração eduardo tem lugar para o que sente uma pessoa eduarda (aliás, que é a mesma pessoa que a minha: simbiose total). O meu amor eduardo comporta o meu amor Eduardo. Vamos eduardar os corações, torná-los possuidores e ricos. Não tenho palpites que possam ser seguidos, eu por ora tive sorte. Não sei se o caminho é a casa noturna. Esqueci de tudo, o único endereço que eu tenho é o número do celular do meu amor, que me leva até a eternidade. A eternidade eduarda.



Amor Irreversível IV (Outono em mim)

(I)

O amor que me espera na porta das manhãs tem me dado fôlego. Há uma semana, jantar em casa, e as flores na imbuia 'inda respiram, se pá com o mesmo vigor com que faço o mesmo agora.
As fotocópias agora são só amigas, com quem pratico queda de braço -sempre me vencem, mas eu gosto-, com excessão de algumas com quem 'inda tento estabelecer conversa. Às vezes eu não entendo palavra do que dizem. Pobres antiquados versus pobre mim, que não sou um clássico.
Mas o amor que me espera na porta das manhãs é supra-pulmonar, meus mecanismos biológicos não são mais da ordem normativa das fisiologias; a fisiologia do amor está me convencendo a revolucionar o fator consuetudinário daquilo que agencio.
Não tenho escolha. Acho que o doutor Marinho da Silva, que roubou o meu coração sob pretexto de melhor estudá-lo (furá-lo, espetá-lo, maltratá-lo, testá-lo, aprová-lo, tomá-lo para si e então me chutar feito sarnento cão, sem coração, sem Eduardo, sem nada) faz um bom trabalho. Senão como médico, como feiticeiro, porque eu estou enfeitiçado (ele deve ser algo parecido com um quimbanda, ou um sacerdote do vodu, com seu cajado de palavras sensíveis e seu bisturi -que mais parece um sorriso- de operações espirituais). Portando ainda seu sorriso maligno -que corta feito um bisturi- temo que me hipnotize. Ou então é tarde demais, e não domino maneira de resgate. Mas nele confio, e no seu senso de comme il faut. Ipso facto ipso jure me submeto: cruzo as pernas de lábios indecisos, cruzadas de amor, indecisos de ansiedade, I never loved a man the way I love him, a Aretha Franklin desabafa.
Mas meus pulmões não me enganam, meu sorriso está aí para tudo quanto sou eu, e de alguma forma Eduardo também está. Quanto mais passam as horas mais me sinto seu, e mais o sinto meu. Tudo tem constituído sentido singular. O Malinowski compartilha disto. De jeito símile as próprias cores, as minhas refeições e a rua. E as pessoas, que são vício tão feliz quanto o que tenho pelas minha unhas.
É esquisito, mas sinto algo de pleno. Desprezo o inverno, a poeira me enfastia. Senão de verão, de outono. Em pleno outono.
Em pleno. Outono.


(II)

As flores da semana passada se esforçam para me entender. Conheço o potencial que têm. Mas vão morrer bem antes de mim. Depois que terminar o player, o pai-dos-burros virtual, e fechar o bloco-de-notas da pós-modernidade, terei uma conversa tête-à-tête com elas.
Expio os crimes de mim -cada vez mais de porre- até lá, com o riso safado do hipócrita: ai que falta de vergonha eu tenho, de ser tão feliz.


(III)

Sinto algo em nós que é maior do que todo o resto, algo que compartilho, que compartilha, que compartilhamos...
Sorrisos se desfazem na poeira das manhãs: é meu amor que vem me buscar mais uma vez para o dia que se anuncia, ninado, ninando, me ninando, meninando...
E eu nunca tive tanto poder.

5:15
20 6 2010

4 comentários:

Eduardo Marinho disse...

Eduardesco texto. Porque esta nossa alma de cofre mais parece planta carnívora: lança perfume para aprisionar a presa. Estou preso de você. E dos seus olhos que se esbugalham quando exprimes um raciocício. E dos seus beijos que me expulsam o inverno em pleno fim de verão.

Eduardo Marinho disse...

Sou carrasco de flores. Amo as tulipas pela resistência que elas tem ao frio e pela podre-poesia que as incuti ao guardá-las na geladeira. Vez por outra as liberto. Quando me sinto mais humano. E quando amo... Olha, mais uma flor indo embora!

merdas de Potato disse...

felicidade é Eduardo

valentina disse...

Sinto tanto carinho ao ler esses pequenos textos, mas que juntos formam uma grande emoção quando lidos .
E essa coisa -não entendendo a palavra como se fosse apenas uma coisa de fato - de Eduardo, achei sinceramente muito fofo, adorei mesmo ((: