Tudo Clama por Amor.
Nada pode ser tão bom na vida. Fazer amor na Bela Vista com jovens homens economicamente emancipados. De todas as janelas posso ver o Viadutos. [Mas nem sempre o Viadutos me vê.]
Um sorriso múmio, meigo, o chão da cozinha é gelado. Eles lutam contra ou a favor de um sotaque que vai perdendo suas curvas e gracejos. Eles passaram um tempo em Londres. Eles têm cuecas da Calvin Klein, às vezes passam o dia vendo televisão - o que é moralmente reprovável -, mas podem passar o dia inteiro falando sobre a poética noir e melancólica dos diretores do leste europeu. Têm barba cerrada e gostam de abraços, abraços tão apertados que quase somem na amplitude do apartamento içado nos anos 1970s: uma drágea de calor numa gelatina glacial. Infinita gentileza, um adicional tão consistente e estomacal quanto o dobro de queijo no lanche do Subway. Alguns passam as camisas. Outros apenas usam regatas - que ostentem suas bisnagas 100% masculinas, 100% tatuadas, 100% valor agregado: horas de flexões, whey protein, BCAA, creatina, termogênicos.
A principal atividade sexual é o abraço, passivo e ativo: o amor é sexualmente transmissível. Tem um que não consegue dormir abraçado. Alguns não querem mediação do látex. Um outro prefere a combinação cueca & boné - e logo torna-se compreensível por que ele dorme de aba reta. Enquanto um apartamento é formidavelmente decorado, outro insiste na mediocridade dos creme, gelo, pastel, frio, morto, cadavérico.
A Bela Vista de prédios tapando as vistas, com frestras através das quais se vislumbra uma malha extensa de casinhas tombadas & tombando, estacionamentos que ainda não viraram torres, bares gordurentos, botiques sedosas ocupadas por transexuais - o picumã, uma ação relevante na bolsa de valores. Do Viaduto 9 de Julho vejo algumas obras-primas da arquitetura modernista - onde já fodi - Artacho Jurado, Rino Levi, Niemeyer - já fodi todos eles. Já perdi a conta de quantas vezes voltei pra casa com as batatas-doces e espinafres da feira do Viaduto Major Quedinho - sá'com'é, você fode na madrugada de sábado pra domingo na Major Diogo, na Praça 14 Bis ou na 9 de Julho e aproveita as ofertas bradadas.
Pois é, fico pensando, nada pode ser mais gratificante na vida. Acho que mobilizo essa porra toda ao meu redor a partir de um manejo - exemplar e não subestimável - de capital-bicha.
Seja como for, fazer amor na Bela Vista com jovens homens economicamente emancipados é um trem bão demais da conta.
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